O melhor de Caio Fernando Abreu: Contos e Crônicas (Coleção "O melhor de") (Portuguese Edition)
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O melhor de Caio Fernando Abreu: Contos e Crônicas (Coleção "O melhor de") (Portuguese Edition)
Não são apenas lembranças, que isso é comum de ter, é mais inquietante que isso: são invasões no real do imaginário e da memória.
Escuta bem, vou repetir no teu ouvido, muitas vezes: a única coisa que posso fazer é escrever, a única coisa que posso fazer é escrever. O Estado de S. Paulo, 21/08/1994
Meu coração é um sapo rajado, viscoso e cansado, à espera do beijo prometido capaz de transformá-lo em príncipe. Meu coração é um álbum de retratos tão antigos que suas faces mal se adivinham. Roídas de traça, amareladas de tempo, faces desfeitas, imóveis, cristalizadas em poses rígidas para o fotógrafo invisível.
Por trás disso tudo, o mais perigoso espreita: a grande traição que estou cometendo, todo dia, comigo mesmo. Porque escrevendo assim, para sobreviver, não escrevo o que me mantém vivo — outras coisas que não estas.
Não se arrancam palavras do nada: as palavras brotam de coisas e seres viventes.
O mais complicado é que, para escrever, é preciso ver o mundo.
Porque não é muito simples escrever, não é assim: você senta, põe papel na máquina e escreve. Às vezes não vem nada. Outras, vem confusamente. Só depois de escrever três ou quatro laudas aparece uma frase — e essa frase é a coisa, o resto não interessa.
É que nem sempre consigo escrever sem sofrer um pouco. Mesmo quando até me divirto, sempre é necessário remexer um pouco mais fundo, e remexer mais fundo cansa.
Ela abriu Margaret Atwood, mas que coisa mais lenta toda aquela história de mulheres vestidas de vermelho,